Escrevi uma página da vida sobre a minha desinteressância
talvez esse seja meu maior talento: ser adequadamente esquecível
Essa sensação incômoda de ser alguém desinteressante não me larga. Observo os outros e vejo brilho, intensidade, histórias que parecem dignas de um livro. Depois olho para mim… e tudo o que vejo é uma página em branco.
Passei tanto tempo tentando entender se sou interessante que esqueci de perguntar: interessante para quem? Segundo quais critérios? Se ser interessante significa viver de forma intensa, cheia de histórias extraordinárias, então pode ser uma pressão impossível de sustentar. Mas se for sobre encontrar beleza nas pequenas coisas, então eu já sou mais do que imaginei.
As pessoas mais interessantes que conheço não se preocupam em ser interessantes. Elas simplesmente fazem, vivem, erram, riem, aprendem e seguem. Enquanto isso, eu fico aqui, paralisada pelo medo de ser sem graça, e ironicamente, é esse medo que me torna exatamente isso.
Me acho tão monótona e entediante que, se minha vida fosse um livro, até eu pularia capítulos, só para chegar logo no final e ver se continua tudo tão sem graça. Mas aí imagino a cena: eu, virando as últimas páginas, encontrando um desfecho sem reviravoltas, sem grandes momentos, sem nada que valesse a pena ter esperado.
E a pior parte? Perceber que fui eu mesma que fiz isso acontecer. Que fui eu que me convenci de que não havia nada a descobrir, eu que me recusei a escrever algo diferente. Pode ser que eu perceba tarde demais que o livro nunca foi o problema, e sim a minha falta de vontade de explorar as entrelinhas.
Acho que me acostumei tanto comigo mesma que tudo me parece previsível, como um filme que já vi mil vezes. O problema pode não ser a falta de acontecimentos, mas a falta de curiosidade em enxergar nuances nas mesmas cenas. Porque, no fundo, até as histórias mais simples podem ser fascinantes, desde que eu me dê o trabalho de olhar para elas com outros olhos.
O tédio pode ser um aviso: um lembrete de que estou parada por tempo demais no mesmo lugar. Talvez a questão não seja a falta de histórias, mas a falta de coragem para vivê-las. A sensação de ser irrelevante pode ser só um reflexo da forma como me trato.
Será que eu já tentei, de verdade, me surpreender? Ou estou apenas confortável nesse ciclo de previsibilidade, reforçando a ideia de que não tenho nada a oferecer?
Quanto mais me convenço disso, menos me movo, e quanto menos me movo, mais verdadeira essa sensação parece. A inércia tem um jeito cruel de me fazer acreditar que sou uma personagem secundária da minha própria vida.
Pode ser que eu esteja esperando demais de mim mesma. Nem tudo precisa ser um grande espetáculo, e ser interessante não significa ser uma fonte inesgotável de entretenimento. Afinal, eu vejo sim beleza na simplicidade.
Mas… e se eu não for tão sem graça assim, e apenas tento medir meu valor pelo impacto que tenho nos outros, em vez de simplesmente encontrar sentido naquilo que sou?
O medo faz parte de absolutamente todos os momentos da minha vida, e ele é tão meu melhor amigo que vejo nele um efeito colateral cruel: ele me imobiliza, e não existe nada mais monótono do que estar paralisado. O paradoxo é que já percebi isso, mas ainda assim continuo refém dessa ideia.
As histórias mais fascinantes não acontecem para quem as espera sentado. Elas acontecem para quem se levanta, se expõe ao erro, tropeça no imprevisível e coleciona cicatrizes que depois viram narrativas. Que lindo! Na teoria é tudo tão mais fácil! O que falta agora é menos teoria e mais prática.
Bem, se eu ainda acredito que sou desinteressante depois de toda essa reflexão? Menos do que antes. Essa habilidade de transformar minha autodepreciação em uma narrativa elaborada já é, por si só, algo fascinante, não é? Não há nada de desinteressante em quem pensa tão profundamente sobre si mesmo. E se, em vez de reafirmar meu tédio, eu tentasse criar algo, testar algo, me jogar em algo novo?
Passo tempo demais encarando a mim mesma, como quem se vê num espelho embaçado e tenta, em vão, limpar o vidro com as próprias mãos. Há partes de mim que preferia não enxergar, mas a escrita não me deixa fugir. Ela me obriga a sentar e ouvir meus próprios silêncios, a transformar meus vazios em frases, minhas inquietações em parágrafos inteiros.
Talvez seja isso que me salve, porque, quando escrevo, não preciso ser interessante para ninguém — apenas verdadeira comigo mesma. E quer saber? Pode ser que isso já me torne interessante de fato.
No fim das contas, eu tenho duas escolhas: continuar repetindo a história de encarar a desinteressância como parte de mim ou virar a página e escrever algo diferente.
Minha história precisa de um novo capítulo. O lado bom? Só eu posso escrevê-lo. O lado ruim? Bom… só eu posso escrevê-lo.
Ou seja, sem jogar a culpa no destino, no Mercúrio retrógrado ou na minha própria preguiça disfarçada de autoconhecimento.
A vida infelizmente não vai me puxar pelo braço. Não é ela que está parada, sou eu. Se quero que algo mude, sou eu que preciso sair do lugar.
QUE TEXTO INCRÍVEL vc falou tão bem sobre esse sentimento, sobre essa cobrança, SÉRIO. Muito obrigada por compartilhar com a gente!!!
"Não há nada de desinteressante em quem pensa tão profundamente sobre si mesmo." Amei essa frase, pois já escutei que pessoas realmente desinteressantes, não refletem tanto sobre si mesmas, acabando não percebendo como elas são. E eu, que também tenho uma enorme insegurança com isso, me sinto ainda mais segura ao ler vindo de vc
me senti atacada, AMEI ♥