Minha maior conquista seria me sentir merecedora das minhas vitórias
Por que é tão difícil comemorar algo que eu tanto sonhei em alcançar?
Sempre me perguntei por que, no instante em que finalmente alcanço algo pelo qual me dediquei tanto, o que sinto nunca parece corresponder ao que eu esperava. Durante o processo, meu mundo se encolhe ao redor dessa meta.
Passo semanas, às vezes meses, orbitando ao redor desse objetivo, me convencendo de que ele vai mudar algo em mim, como se atravessar essa linha imaginária fosse capaz de me aliviar de quem eu sou.
É estranho como me acostumei a isso, como ensinei a mim mesma que o fim de algo deveria bastar, que é suficiente terminar, riscar da lista, seguir em frente. Mas sei que não é. Não é suficiente, e nunca foi.
Reconhecer o caminho que percorri deveria ser tão valioso quanto cruzar a tão esperada linha de chegada.
Alcançar um objetivo, um sonho, deveria ser uma espécie de vitória, mas, para mim, nunca parece ser assim. Quando termino algo pelo qual me esforcei, o sentimento que me vem não é alegria, nem orgulho; é alívio. Um alívio quase anestésico, que tira o peso dos meus ombros, mas deixa um vazio estranho no lugar. Pra mim, não existe comemoração, a sensação de conquista; apenas o fim de algo, mais uma tarefa cumprida.
Às vezes, penso que nunca aprendi a comemorar porque, em algum lugar da minha vida, internalizei a ideia de que celebrar é uma frivolidade; algo superficial, inútil. Algo reservado para os outros. Para mim, sobrou o trabalho, a execução, o cumprimento dos deveres.
Essa crença é uma prisão que eu mesma ajudei a construir, mas ela tem raízes profundas. Me faz olhar para minhas conquistas como passos inevitáveis, um percurso obrigatório de uma vida que se organiza em torno de responsabilidades.
Sei o quanto cada uma exige de mim, negar isso seria desonesto. Sei das noites sem dormir, das escolhas difíceis, da energia drenada até o limite. Mas dizer isso em voz alta também me parece inadequado, como se minhas dificuldades fossem insignificantes perto daquelas que outras pessoas enfrentam.
Então, fico calada. Eu me convenço de que não tenho direito a essa queixa, as o reconhecimento do esforço nunca se transforma em satisfação. Parece que minha própria conquista é algo que assisto de fora, como se tivesse acontecido com outra pessoa. Eu olho para o que fiz como quem olha para um quadro – bonito, talvez, mas distante, sem conexão.
De algum modo, construí um sistema cruel de validação para mim mesma. Funciona assim: se eu fizer algo, então, quem sabe, eu mereça existir.
Desejo mudar isso. Aprender a me apropriar das minhas vitórias, mas não de forma teórica. Quero senti-las, permitir que elas se tornem parte de quem sou. Olhar para cada conquista e enxergar, além do resultado, o que me trouxe até ali.
Entre a linha de chegada e a comemoração está o espaço para me reconhecer.
Perceber a pessoa que fui, aquela que teve medo, que hesitou, que quase desistiu, mas continuou. Porque isso também faz parte da história. Na verdade mesmo, é a parte mais importante.
Basta que eu pare, respire e diga, com a mesma simplicidade com que encho um copo de água ou ajeito meu travesseiro: isso foi mesmo importante pra mim. Eu sou importante pra mim. Não preciso justificar isso para ninguém. Não preciso pedir desculpas por reconhecer algo que sempre foi meu.
Seria tão bom entender de uma vez por todas que não preciso que o mundo me veja; preciso me ver. Encontrar uma maneira de deixar minhas conquistas existirem plenamente, de dar a elas o espaço que merecem. Aceitar que o valor delas não está em sua grandiosidade, mas no fato de que carregam pedaços de mim – do meu tempo, da minha força, da minha vida.
O que busco não é apenas o reconhecimento das minhas conquistas, mas algo mais essencial: o reconhecimento de mim mesma. Perceber que, em cada esforço, em cada passo dado, havia um pedaço de mim que tantas vezes ignorei. É como se, ao longo do caminho, tivesse deixado partes de quem sou espalhadas pelo chão, na urgência de chegar ao próximo destino.
Preciso recolher essas partes, olhar para elas com cuidado, e sentir que há uma história ali que merece ser contada – uma história que é minha, que fala de tudo o que enfrentei e tudo o que me tornei.
Será mesmo que é preciso ser extraordinário pra ser suficiente? Estar aqui, vivendo, lutando, tentando, já é um feito monumental, não?
Não quero mais olhar para as minhas conquistas como simples placas ao longo da estrada da minha vida, aquelas que passo apressada, sem nunca parar para admirar a paisagem ao redor. Quero aprender a desacelerar, permitir que cada vitória seja um momento de contemplação.
E quem sabe, essa história comece naquilo que parece mais banal: o caderno onde anoto todos os objetivos que preciso cumprir no dia. Escrever essas listas sempre me deu uma sensação de controle, ainda que temporária. Como se ao transferir para o papel o que precisa ser feito eu pudesse aliviar um pouco a bagunça na minha cabeça.
Existe algo reconfortante naquele gesto de pegar a caneta, escrever cada tarefa em letras firmes, precisas. É como se, ao colocar o que precisa ser feito no papel, encontrasse um tipo de segurança. Mais do que isso, simplesmente amo o prazer sutil de riscar cada uma delas quando é feita.
Cada linha traçada na lista é como o toque final de quadro meu, pequenas pinceladas que mostram o progresso de algo que está ganhando forma… Mas, mesmo assim, ainda não é suficiente.
Li em algum lugar certa vez que não existe momento melhor que o agora, e acho que é isso que mais me assusta: a força do presente, o chamado para estar nele por inteiro.
Me olho no espelho e digo: sou mais que as metas que traço, mais do que aquele caderno onde os dias se acumulam. Sou alguém que existe, um coração que bate, ritmado, às vezes apressado, outras vezes hesitante. Sou alguém que sente, mesmo quando não quer. Mesmo quando sente coisas que não entende.
Sou tudo isso e muito mais, e deveria bastar, nem que seja apenas no espaço íntimo do meu ser.
Me identifiquei tanto com esse texto, do início ao fim. Acho que, no meu caso, não comemoro minhas conquistas porque sempre ouvi que "não fiz mais do que a minha obrigação". Me fizeram acreditar nisso, e essa ideia está enraizada em mim, mas estou no processo de arrancá-la. Obrigada por este texto incrível 🤍
eu tenho uma amiga que me ensinou muito a enxergar mais as minhas vitorias. hoje eu moro nos Estados Unidos, ela no Brasil, e ano passado eu passei uns 4 meses me dedicando a bolar 3 capas pra um projeto de lançamento de um EP de uma outra amiga minha. a gente se ligava em chamada de video e ela acompanhou todo o processo de feitura dessas capas... e ai quando eu terminei, era esse sentimento de alívio, de "finalmente terminei". quando a gente se ligou, ela disse "amiga, você precisa comemorar esse marco". eu ri. nem tinha passado pela minha cabeça essa possibilidade, parecia tão bobinho pra mim. mas ela arrumou uma vela, pegou um resto de chocolate pra fingir q era um bolo, e cantamos "parabéns" pelo meu feito - eu daqui e ela de lá. foi tão wholesome. eu me senti tão vista. tão viva. parecia que eu finalmente tava vendo o que eu tinha feito. até hoje eu tento prestar atenção nessas coisas, procurando um motivo pra celebrar. acho que esse é um bom lugar pra começar :)